sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Listas #1 - Melhores livros de 2015

Olá!

Com a proximidade do final do ano, além dos projetos, é o momento de relembrar as leituras realizadas deste ano, então separei as minhas seis melhores leituras. Fazendo um balanço geral, eu acho que meu desempenho de leituras deste ano foi de regular a bom, eu li até o momento, 36 livros e 8 HQs (graphic novels e mangás), com uma média de 3 livros por mês. Acho que foi relativamente pouco, vou tentar aumentar minha meta pro próximo ano.

Então, vamos ao top 6!


*Os livros não estão listados hierarquicamente, do pior para o melhor.

1) A Coisa - Stephen King
O meu calhamaço do ano foi também uma das minha melhores leituras, no kindle, eram cerca de 2000 páginas, mas que devorei em menos de um mês, de tão envolvente. Conta a história da cidade fictícia de Derry e de seis moradores, únicas pessoas que conseguem entrar em contato com o que há de mais sombrio nesta cidade, A Coisa, personificada como um palhaço aterrorizante. Esses seis moradores, crianças no início da história, unem-se e tornam-se amigos pelo medo, inicialmente de outras crianças da cidade que praticam bullying com eles e depois, pelo segredo que os une, de serem os únicos a saberem da existência da Coisa. Além de acompanharmos a histórias dessas crianças por flashbacks, já que nos dias atuais eles já são todos adultos, vemos o reencontro deles, afastados há anos deles mesmos e da cidade natal, mas que mais uma vez unem-se a fim de derrotar de uma vez por todas A Coisa de Derry.

2) As Virgens Suicidas - Jeffrey Eugenides
Conheci esta história primeiramente através do filme de Sofia Coppola, apesar da crítica ter sido muito positiva, não foi um filme que me empolgou, talvez devido as minhas altas expectativas. Deu-se o oposto quanto ao livro, estava na espera de uma história mediana, mas a escrita de Jeffrey Eugenides me encantou do início ao fim. Como no livro anterior, há o enfoque em uma cidade, mas mais na família Lisbon e nas cinco lindas filhas do casal, todas jovens, com idades de um ano de diferença, dos treze aos dezessete anos. Sabemos dessa história pela perspectiva de um grupo de amigos vizinhos de mesma idade, aparentemente eles narram a história já adultos, mas são poucas as indicações nesse sentido, e que eram completamente fissurados pelas meninas, acompanhavam-nas pelos seus binóculos pelas janelas de suas casas, encontravam-se às escondidas para ficarem espiando e especulando sobre suas misteriosas vidas. O fascínio aumenta sobremaneira após o suicídio da mais nova, Cecilia, e em como as outras meninas parecem ter o mesmo propósito, ao mesmo tempo em que são subjugadas por uma mãe intimidadora e super protetora. Este livro levou-me a querer ler mais do autor, a narrativa escrita pela perspectiva dos meninos, com toda adoração e aura de mistério, é cativante.

3) A Redoma de Vidro - Sylvia Plath
Eu tenho dificuldade em saber qual livro, filme, etc eu gosto mais em relação a outro, mas este livro eu não tenho dúvidas de que foi minha melhor leitura do ano e está nos meus preferidos da vida. Depois de terminá-lo, eu ainda reli duas vezes de tão apaixonada que fiquei por Sylvia Plath e Esther Greenwood, a protagonista da história. É um livro autobiográfico, Esther é a personificação das próprias vivências e angústias de Sylvia e foi escrito semanas antes do suicídio desta, talvez por ser tão visceral tenha me encantado tanto. A narradora é a própria Esther, jovem adulta americana da década de 20 que sonha em ser poetisa, mas ao ser recusada em um curso de oficina de ficção e ter ido trabalhar por algum tempo em Nova York, saindo pela primeira vez de sua cidade natal, Boston, começa a se questionar se realmente é boa o bastante para escrever, quiçá viver, e cai numa profunda depressão, indo parar em diferentes instituições psiquiátricas. O sofrimento de Esther também é claramente por se sentir tão diferente de todas as outras jovens de sua idade, em Nova York por exemplo ela sente-se deslocada por não ser tão fútil quanto as colegas e, diferente do sonho da maioria das mulheres de sua época - de sua mãe inclusive - ela não quer casar e nem trabalhar às custas de um homem como datilógrafa, a profissão que sua mãe empurra a ela constantemente, seu sonho é trabalhar por si só, com seu trabalho, escrevendo, ela é o que se pode chamar, de forma bem clichê, uma mulher a frente do seu tempo. Mas é triste e ao mesmo tempo bonito acompanhar o quanto manter-se verdadeiro consigo mesmo, a despeito dos outros, pode ser causa de tanta angústia, tanto quanto da própria autora que, infelizmente, não conseguiu suportar.

4) O Tempo e o Cão - Maria Rita Kehl
Ainda na temática da depressão, este é um livro de não-ficção sobre o tema da psicanalista Maria Rita Kehl, vencedor do prêmio Jabuti de não-ficção. É um livro muito preciso, um estado da arte sobre o tema, escavando como a depressão foi vivenciada ao longo da História, sob que nomes e  quais determinantes históricos a ela esteve ligada, além de tecer um belo panorama contemporâneo sobre as condições de possibilidade para o aparecimento da depressão dos dias atuais, como a vivência de tempo e espaço interferem nas experiências subjetivas, que podem desembocar nos estados depressivos, como esse diagnóstico aparece tanto atualmente, recebendo inclusive a alcunha de "doença do século". Ao final, ela explora como a psicanálise entende a depressão, expondo uma tese pessoal muito pertinente. As referências são várias, Lacan, Winnicott, Walter Benjamim, Marx, Bergson, Baudelaire, é um livro pra ser lido e relido pra quem se interessa pelo tema.

5) A Amiga Genial - Elena Ferrante
Tanto este quanto A Redoma de Vidro, eu havia lido para o clube de leitura leia mulheres do Rio de Janeiro, infelizmente não consegui ir em nenhum dos dois meses, mas ambas foram as minhas melhores leituras do ano, um belo presente. Elena Ferrante é o pseudônimo de uma italiana, mas não se sabe quem é, não dá entrevistas, ninguém nunca a viu, sequer se sabe se é homem ou mulher, sob essa aura de mistério, encarna a tetralogia iniciada pelo livro A Amiga Genial sobre uma amizade permeada de muito amor e ódio entre a narradora Elena e sua amiga Lila, moradoras de uma vizinhança muito pobre em Nápoles na década de 50. Elena conhece-a desde muito pequena, na escola quando se surpreende com a inteligência "natural" da amiga, colocando-a numa aura de magnitude que a acompanhará por toda a vida, sente-se diminuída por quanto ela, Elena acha que precisa esforçar-se sobremaneira para sobressair-se na escola (e depois, na vida), enquanto que para Lila parece ser inteligente sem grandes esforços. Ao longo da história, em pequenos apontamentos fica claro o quanto esta aura é muito mais produto das fantasias de insegurança de Elena do que de uma genialidade de Lila. Este primeiro livro vai desde a infância das duas até o casamento de uma delas, terminando com aquele gancho que nos impele a querer continuar para o próximo livro, é uma história envolvente e verdadeira sobre as paixões que envolvem uma grande amizade.

6) A Morte de Ivan Ilitch - Lev Tolstói
Minha segunda experiência com Tolstói, um livro pequeno, mas incrível, os autores russos são realmente invejáveis em sua escrita. Narra os três dias que antecederam a morte de Ivan Ilitch, onde ele faz uma verdadeira retrospectiva de toda sua vida, seu relacionamento com amigos, mulher e filhos, seus arrependimentos e conquistas, põe-se a elaborar toda sua vida, desde a infância, juventude, até a velhice. Estar confrontando a morte tão de perto também é tema de suas divagações e reflexões, vemos um homem moribundo temendo aquilo que não pode entender, tentando buscar explicações para o depois de sua morte. É um livro breve, mas muito rico, depois deste e de Anna Karenina, impossível não querer ler tudo de Tolstói.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Sobre o Livro #2 - As Brumas de Avalon



[CONTÉM SPOILERS]

Olá!

Finalmente, terminei a leitura dos quatro volumes de As Brumas de Avalon, não consegui manter os diários de leitura, então achei melhor fazer um post só sobre todos os livros. Já comentei um pouco sobre o primeiro livro, Senhora da Magia, mas agora pretendo falar da história como uma só, não vou subdividir onde acontece o quê, pra dar mais dinamismo e também porque a história é pra ser lida assim mesmo, de uma vez só, como um único livro, há bastante encadeamento entre eles.

Como já havia dito, esses livros contam a perspectiva feminina do mito do rei Arthur, eu digo mito pois não se sabe até hoje se ele realmente existiu, ele teria vivido em torno do século V, mas sua história está cercada por misticismo, acontecimentos e personagens fanstasiosos, sendo objeto de várias versões. Esta de Marion Zimmer Bradley segue o contra-fluxo dessas versões ao focar nas mulheres, principalmente na meia-irmã de Arthur, Morgana, comumente retratada como uma mulher maquiavélica e pérfida, mas aqui há uma versão mais humana, tornando-se uma das minhas personagens mulheres preferidas da literatura.

Os livros iniciam-se desde antes do nascimento do futuro rei e do casamento de seus pais, Igraine e Uther, acompanhamos uma Morgana ainda recém-nascida, fruto da união do primeiro casamento de Igraine com o duque Gorlois. Com a ascensão de Uther ao trono, arrebatada pela paixão, Igraine, antes uma mãe devotada, passa a investir completamente em seu casamento, sobrepujando-o à maternidade, o que não é sem sofrimento para a pequena Morgana, que se vê obrigada a ser ela mesma mãe de seu irmão Arthur. Anos depois, Viviane leva a já crescida Morgana para tornar-se sacerdotisa de Avalon, e no futuro substituir Viviane no cargo de Grande Sacerdotisa.

Entretanto, após o controverso Grande Casamento, Morgana abandona Avalon, grávida e completamente amargurada em relação ao seu destino, há pela primeira vez um profundo desgosto em servir sua vida a Deusa, sente-se manipulada por Ela e, em consequência, por Viviane, que seria a representação da Deusa na Terra, o instrumento através do qual Seus propósitos são executados. Assim, Morgana abandona o posto de sacerdotisa e refugia-se na corte de sua tia Morgause, casada com Lot de Orkney, vale lembrar que este rei havia ambicionado ser o Grande Rei, sendo preterido a Uther, por isso tanto ele quanto sua gananciosa esposa sonham em colocar no trono um de seus filhos. Na corte de Morgause, Morgana dá a luz ao seu filho Mordred, mas o deixa para ser criado pela tia.

Paralelo a tudo isto, o rei Arthur ascende ao trono após a morte do pai e casa-se com a cristã fervorosa Guinevere, para mim os capítulos protagonizados por ela são os mais enfadonhos, sua temeridade inquestionável ao Cristo, sua devoção e fanatismo pra mim são muito cansativos, principalmente porque há muitas contradições e conflitos internos entre seus desejos mais íntimos e a fé cristã. Seu maior conflito é o fato de não ser apaixonada por seu marido, mas pelo seu primo e amigo mais íntimo, Lancelote, esta paixão é mote de toda a angústia e culpa de Guinevere. Além disso, a rainha não consegue realizar o que seria sua única função enquanto mulher de um rei: dar-lhe filhos, ela então associa sua esterilidade com o pecado de desejar outro homem, que não seu marido, tornando-o como uma penitência pelos seus pecados.

O contraponto entre Guinevere e Morgana e outras mulheres de Avalon é o ponto mais interessante dos livros para mim. Um dos grandes fios condutores das histórias é a religião, de um lado, o cristianismo e de outro o paganismo, e ambas as crenças tem uma visão completamente oposta em relação ao papel da mulher, pela perspectiva de Guinevere, o cristianismo tem uma visão da mulher como abjeta, fonte de todo o pecado do mundo, desde Eva, ela deve ser submissa, colocar-se sempre atrás dos homens e sentir-se culpada pelo simples fato de ser mulher. Ao contrário, em Morgana, vemos a exaltação do feminino, a mulher como aquela que dá a vida, não é a toa que em Avalon se cultua a Deusa e não o Deus, vê-se isso em todas as atitudes de Morgana, mesmo quando se afasta de Avalon, ela ainda mantém uma postura de não submissão e de autoridade, invejada por Guinevere, diga-se de passagem.

Os acontecimentos vindouros são voltados para as façanhas do rei Arthur, como ele conseguiu juntar em torno de si os cavaleiros da Távola Redonda e expulsar os saxões da Bretanha, através de sua espada Excalibur, encantada com a magia de Avalon para que ele nunca perecesse enquanto a portasse. Esta espada é o símbolo do juramento de Arthur que, em troca de sua magia, promete defender o paganismo e as religiões célticas junto ao cristianismo. Esta promessa é quebrada, com insistência de Guinevere, e o rei Arthur depõe a bandeira usada pelo seu pai, com os Dragões, símbolo de todas as religiões pagãs para usar somente o símbolo da cruz. Tal perjuro é condenado, obviamente por Viviane e também por Morgana que toma essa traição para si e passa a tentar, principalmente após a morte de Viviane, vingar tal perfídia em nome de Avalon.

Apesar de aproximar-se mais de Avalon, ainda assim Morgana não assume o posto de Grande Sacerdotisa após a morte de Viviane, ela casa-se com o velho Uriens da Gales do Norte, e toma forças para vingar Avalon após envolver-se amorosamente com o enteado, filho de Uriens, Acolon. Mas suas tentativas de fazer Arthur cair não funcionam e ela mais uma vez depara-se com muita dor e sofrimento durante esta jornada, permeada de muito ódio aos cristãos e de muita amargura por ver Avalon ir aos poucos sendo consumida pelas brumas e também culpa, pois acredita que ao abandonar Avalon grávida, ela de certa forma, deixou que o destino se configurasse desta forma. 

Aqui é o ponto onde, ao mesmo tempo que há disparidades, também tem alguma convergência entre Morgana e Guinevere, ambas são movidas pela sua fé, a seu modo e sentem culpa por acharem que não estão cumprindo a vontade de seus deuses por mais que suas vidas inteiras tenham sido dedicadas a manter viva suas crenças. Portanto, apesar de tão diferentes entre si, as diferentes narradoras desta história, Igraine, Viviane, Morgause, Morgana, Guinevere, Nimue, Niniane, todas tem em comum esta devoção incontestável por seus deuses, uma relação de amor e ódio profundos pela sua religião, na tentativa de conciliar seus desígnios indecifráveis com seus próprios desejos e paixões. Enfim, são personagens humanas e isso que me faz gostar e sentir tanto carinho por essa saga.

Espero que tenham gostado e até a próxima!